Um caminho alternativo para a liberdade de imprensa
Numa época em que a informação circula ao redor do mundo a uma velocidade estonteante, graças àquilo que a evolução da tecnologia nos permitiu alcançar nos últimos anos, a censura é um elemento ainda muito presente em alguns países sob regimes ditatoriais, sendo os media nestes territórios alvo de escrutínio e os jornalistas alvo de perseguição governamental.
Assim, um esforço coletivo de diversas ONGs de defesa da liberdade de informação traduziu-se na criação, a 12 de março de 2020, de um caminho alternativo de difusão que pudesse contornar a censura. O Minecraft, um jogo interativo reconhecido a nível mundial que permite a construção de mundos virtuais a partir de blocos, hospeda hoje um servidor/mapa que reúne milhares de obras de jornalistas que tenham sido assassinados, encarcerados ou exilados por governos restritivos devido às suas publicações. Será relevante notar que o dia do seu lançamento corresponde também ao Dia Mundial Contra a Cibercensura, celebrado a 12 de março.
The Uncensored Library é uma vasta biblioteca virtual, lançada pela Reporters Without Borders – ONG sediada em Paris – e criada pela BlockWorks, DDB Berlin e MediaMonks (juntando 24 criadores de 16 países diferentes), numa tentativa de contornar a censura existente atualmente. Este projeto de arquitetura neoclássica digital abrange todos os 180 países do Índice de Liberdade de Imprensa (segundo a Reporters Without Borders), tendo um especial foco em cinco países com baixo Índice – o Egito, o México, a Rússia, o Vietnam e a Arábia Saudita. Cada um destes cinco países tem uma secção completa da biblioteca a eles dedicada, contendo diversos artigos banidos. A censura toma diferentes facetas: no Egito, não existe qualquer liberdade de informação; o México é considerado o país cujos jornalistas correm maior risco, sendo que a interferência governamental e de cartéis muitas vezes culmina na morte dos que ousam espalhar informação quer para dentro, quer para fora do país.
Todas as obras (mais de 200) estão disponíveis para qualquer pessoa com acesso à Internet, independentemente da sua geolocalização, tanto na versão original como na traduzida para inglês. As duas formas através das quais é possível aceder aos artigos são: a conexão ao servidor em questão diretamente no jogo ou o download do mapa, disponibilizado no website original do projeto. É possível ler, entre os livros disponíveis em formato digital, obras de ativistas como Khashoggi – jornalista alegadamente assassinado pelo governo da Arábia Saudita, após publicação de artigos de opinião relativos ao regime restrito vivido no país. Adicionalmente, estão também presentes artigos do website russo grani.ru, banido do acesso ao público, e do portal egípcio Mada Masr. Foi, ainda, posteriormente adicionado um departamento focado no Covid-19, expondo a forma da qual a censura de imprensa terá impactado a reportagem de informação ao redor do mundo ao longo da pandemia, – este inclui livros sobre 10 países: Brasil, China, Egito, Hungria, Irão, Myanmar, Coreia do Norte, Rússia, Tailândia e Turquemenistão.
A Uncensored Library ganhou, desde o seu lançamento, vários prémios internacionais – entre os quais se incluem três Cannes Gold Lions (prémio de comunicação criativa) e um Clio Grand Prix. Estima-se que a sua existência terá gerado, até agora, um total de 47.3 milhões de interações nas redes sociais, mais de 25 milhões de visitas à própria biblioteca e um aumento em 62% de donativos para a ONG Reporters Without Borders.
Esta biblioteca virtual tem vindo a provar ser um elemento sólido e fundamental no combate à censura de imprensa, permitindo criar, através da dificuldade legal que implicaria uma tentativa de subversão do servidor, uma espécie de porto seguro para informação internacional.
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