O Afeganistão vive agora um período assolado pelo medo e pela radicalização de leis que, instituídas pelos talibãs, impõem um retrocesso nos direitos e liberdades que muitos afegãos conseguiram alcançar nos últimos 20 anos. As pessoas que se identificam com a comunidade LGBTQ+ são das mais afetadas por este novo governo, controlado pelo grupo fundamentalista islâmico, e vivem cada dia com medo de morrer.
Após terem tomado a capital do Afeganistão, Cabul, os talibãs conseguiram tomar controlo do resto do país, chegando ao poder com pouca resistência. Apesar de se acreditar que estes iriam seguir um caminho mais moderado e não obstante as promessas feitas inicialmente pelo grupo extremista, a realidade parece ser a oposta. Com o governo talibã já constituído, são já muitas as preocupações da comunidade internacional relativamente ao retorno de violações de direitos humanos no país.
Mulheres, crianças, pessoas com deficiências, membros de grupos nacionais / raciais / minorias étnicas e pessoas LGBTQ+ são alguns grupos que sempre sofreram pela sua fragilidade no Afeganistão. Segundo o reportório feito em 2020 pelo departamento de estado dos EUA referente às práticas de Direitos Humanos no Afeganistão, discriminação, abusos verbais e ameaças contra a integridade física destas pessoas sempre existiram no país.
A vida nunca foi totalmente segura nem agradável para as pessoas LGBTQ+, mas a situação de vulnerabilidade agrava-se de dia para dia. Antes da chegada dos talibãs ao poder, havia relatos de perseguição e violência pela sociedade e pela polícia para com estas pessoas, muitas delas podiam enfrentar anos prisão de acordo com o Código Penal do país, de 2017. É de realçar que as condições garantidas a indivíduos que se identificavam com a comunidade eram e são agora ainda mais precárias, designadamente no acesso a serviços de saúde, mas também de trabalho, apenas pela sua orientação sexual, que sempre foi vista como tabu e algo impróprio.
A Sharia é uma lei islâmica aplicada em diversos países, incluindo o Afeganistão, que passará a ser governado com base nesta, tal como referido por um comandante talibã, Wahidullah Hashimi: “We will not discuss what type of political system should we apply in Afghanistan because it is clear. It is Sharia law and that is it”, num comunicado à Reuters. No anterior mandato deste grupo no país, entre 1995 e 2001, a homossexualidade era um crime punido pela morte, segundo a interpretação talibã da Sharia. A sua interpretação e aplicação atual, ainda que menos radical e severa do que no período anteriormente controlado pelo grupo radical, é uma demonstração do retrocesso face aos avanços conquistados nos mais diversos setores da sociedade durante a intervenção dos EUA no Afeganistão (2001-2021).
Viver na escuridão parece a melhor solução para estas pessoas. A maior parte sente-se abandonada pela comunidade internacional, por não lhes ter sido oferecida maior assistência para fugir do país. Perante tudo isto, não são assim tantas as organizações que se dedicam à proteção dos direitos e liberdades desta comunidade. A maior parte opera na clandestinidade por não se poderem registar junto do governo, o que dificulta o seu trabalho e a garantia do apoio dado aos que mais precisam. Outras organizações estabelecidas, expressam já a sua posição perante a situação destas pessoas no país, tal como feito pela Rainbow Railroad, que referiu que “não devemos perder de vista o fato de que precisamos de políticas mais proativas para ajudar pessoas LGBTQI + em situações de crise”.
Existem outros fatores que dificultam ainda mais a assistência ou a garantia de segurança destes afegãos LGBTQ+. O Afeganistão é um país em constante conflito. Para além disto, estas pessoas, ao procurarem asilo, enfrentam perigos como serem enviados para países que não têm uma boa relação histórica com a aceitação e garantia dos direitos desta comunidade, correndo o risco de nesses países serem submetidos a testes físicos invasivos de forma a deduzir a sua homossexualidade.
Assim, percebemos que a comunidade LGBTQ+ é ainda hoje percecionada de forma negativa por muitos países. Tendo em conta o conjunto de ameaças que enfrentam diariamente, estas pessoas continuam a ser das mais desprotegidas e vulneráveis em países como o Afeganistão. A repressão e a perseguição deste grupo irá continuamente agravar-se neste país, caso não haja uma maior intervenção por parte de ONG’s especializadas no apoio a refugiados, obrigados a fugir por diversos motivos. É por isso também premente que os estados estejam abertos a garantir proteção aos requerentes de asilo, nomeadamente a todas as pessoas afetadas por conflitos, em que lhes são diariamente negados direitos humanos, como o direito à vida e segurança.
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