A Revolução Digital ainda está em andamento, mas o capítulo mudou com a invenção da internet nos anos 90. A internet abriu portas para toda uma nova realidade, o mundo ficou mais pequeno e mais complexo. Permitiu-nos estar ainda mais ligados, o comércio tornou-se ainda mais fácil, a comunicação instantânea, e agora em tempos difíceis com a pandemia, mantem a sociedade a funcionar, e, é impossível pensarmos no que estaria a acontecer se não tivéssemos esta tecnologia com relativamente fácil acesso. A internet trouxe, sem dúvida inovações muito significativas, mas a criação de redes sociais tem o seu destaque. Segundo a Our World in Data em 2016, 3.5 mil milhões de pessoas já tinham acesso à internet, e em 2018, o Facebook tinha 2.3 mil milhões de utilizadores, ou seja, as redes sociais tornaram-se num local apetecível para partilha de informação. É aqui que passamos para o próximo capítulo.
A Primavera Árabe, na Tunísia e no Egipto em 2011, foram uma demonstração construída nas redes sociais, o movimento #metoo, contra o assédio sexual contra as mulheres dentro de Hollywood, tiveram uma partilha de mais de 19 milhões de visualizações no Twitter, e mais recentemente o movimento Free Hong Kong, levou milhares de pessoas para as ruas para lutarem pela independência de Hong Kong, despertados pela introdução de uma nova lei de segurança nacional chinesa. As redes sociais tornaram-se numa plataforma de demonstração política. Falando da China, é talvez o exemplo que nos vem á memória quando falamos de utilização de tecnologia, por parte de um Estado, para guiar a sua política interna e externa. O uso de redes de câmaras de vigilância e o bloqueio de diversos sites, especialmente, redes sociais ocidentais, que são utilizados de forma a bloquear a população do acesso a informação não controlada pelo governo chinês, embora, muitos dos elementos do governo e média tenham acesso a estas mesmas redes sociais, que lhes permitem fazer a sua propaganda pelo mundo ocidental, são duas das formas de como a China utiliza a tecnologia.
O novo capítulo tecnológico inicia-se com o 5G, a base para a concretização da internet das coisas. Já em andamento, a internet das coisas irá ligar praticamente todos os dispositivos, como casas inteligentes, carros, torradeiras (literalmente) e outros dispositivos futuros. O mundo futurista que muitos de nós já imaginámos, com cidades inteligentes, veículos que circulam sozinhos, novos robots, inteligência artificial, que vão diminuir a distância entre o físico e o digital, o 5G desempenha um papel fundamental para desbloquear todo este potencial. A baixa latência e o aumento de capacidade de processamento, vão impulsionar ainda mais o desenvolvimento de inteligência artificial e machine learning, modificando o contexto geopolítico digital futuro. Idealmente a utilização de tecnologia deveria de ser para aumentar a qualidade de vida de todos, mas a tecnologia teve sempre outras aplicações, e a segurança é um dos receios do 5G. A utilização de drones e aeronaves não tripuladas não são novidade, mas somando o 5G, inteligência artificial e as aeronaves não tripuladas, poderemos ver a guerra a tornar-se, de novo, viável, deixando para trás a diplomacia. Com mais dispositivos ligados, é de se esperar que o hacking também aumente, o que levanta ainda mais questões de segurança e de prevenção dada a quantidade de áreas que podem ser afetadas por estes ataques. Embora os ataques sejam, maioritariamente, efetuados por organizações criminosos, o que complexifica o panorama político é que muitos são através de patrocínios de Estados, como a China e a Rússia, levantando questões de segurança nacional.
Os EUA têm sido um dos principais impulsionadores das inovações digitais, mantendo a hegemonia no que trata aos acessos a informação e redes sociais, pelo menos no Ocidente. Do top 10 de empresas mais valiosas do mundo, 6 são empresas tecnológicas, e 5 destas são norte-americanas, como a Alphabet (Google) ou o Facebook. Arriscaria dizer que os EUA estão pela primeira vez atrasados na tecnologia, e as evidencias económicas e de segurança são suficientes para percebermos a dimensão que o 5G pode ter quando a sua implementação for mais generalizada. Segundo William Barr, o Procurador Geral dos Estados Unidos, cerca de 40% da infraestrutura do 5G mundial é dominada pela Huawei e ZTE, ambas empresas chinesas visadas pela Comissão Federal de Comunicações. A guerra comercial iniciada em 2018, entre os EUA e a China, tornou-se num confronto tecnológico e geoestratégico sobre o domínio das infraestruturas 5G.
Cada revolução trouxe mudanças políticas, e o 5G não é exceção. As redes são a “nova geografia” do nosso tempo e o domínio das infraestruturas determinará quem controla a internet das coisas e toda a sua capacidade. Ainda é cedo para declarar um vencedor, desde logo porque ainda estamos no início, mas também porque são demasiadas as questões que influenciam o domínio político e as relações internacionais. Por agora resta-nos apenas esperar e ver para onde a tecnologia nos irá levar.
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