Porquê olhar mais além? A maioria de nós tem, pelo menos, uma ideia vaga dos contornos do globo, embora esta ideia deixe muitos espaços conceptuais por preencher. Inevitavelmente, acabamos por desenvolver ideias vívidas das realidades com as quais temos contacto, que por vezes se revelam em estereótipos, ou conceitos macro que nos são vendidos em segunda mão, de um outro com o qual não temos contacto directo. Por outro lado, também os mapas nos transmitem imagens incompletas, ou até facciosas. Sabemos que o planeta é esférico, mas existe no imaginário colectivo uma ideia plana do mesmo, com uma linha média e extremidades, de onde emergem conceitos como “Mediterrâneo”, “Médio Oriente”, ou “Extremo Oriente”, expressões que derivam da definição de um referencial geográfico puramente subjectivo. Consciencializando-nos dessa subjectividade e dos vácuos do imaginário, coloca-se a questão: “o que há que não sei, e o que houve que não me foi ensinado?”
“The Silk Roads” de Peter Frankopan é uma das obras que nos leva a explorar esse desconhecido. O autor constrói o argumento, tendo se colocado no lugar de fazer a mesma questão, de que o suposto centro (que é imaginário) do mundo passou por outros lugares ao longo da história. Os romanos tê-lo-ão entendido, e é quando a sua expansão se direcciona a oriente que o império tem o seu apogeu. É lá que se defrontam com o que talvez tenha sido o centro da civilização do velho continente, ou por outras palavras, onde as culturas se cruzavam e misturavam, produzindo ideias novas e refinando as suas com outras trazidas de longe, a antiga Pérsia. Esta não é uma afirmação que se faça valer por ideias de superioridade ou de centralidade de um certo povo em particular – é apenas o resultado de que por lá era um ponto de encontro na mais conhecida estrada da história, de onde vem o título do livro.

Questões como as relações económicas e comerciais entre os povos da eurásia, bem como a história de locais que hoje estão esquecidos ou caricaturados, como a Ásia central e o Afeganistão, são exploradas, mas não só. É sabido que Agostinho de Hipona, um dos doutores da igreja católica e um grande contribuidor para uma linhagem de filosofia política, foi influenciado por Mani, um profeta zoroastriano. Isso por si indica-nos que talvez a religião não seja tão estanque como a imaginamos, e sendo comum haver menção da religião quando o tema é Médio oriente e Ásia, menos comum será a referência a estas zonas como auto-estradas de ideias, e onde os pensadores e os seus pensamentos se cruzaram, e que isso nem sempre resultou em conflito. Limitados pela nossa percepção, e pela circunscrição temporal a que esta nos restringe, uma ideia mais abrangente do passado pode facilmente abrir-nos a imaginação, e fazer olhar para o futuro com outros olhos.
“The Silk Roads” é um livro relativamente extenso, mas que a leitura acessível torna fácil de consumir. A organização temática dos capítulos confere-lhe um tom “episódico”, e temos a oportunidade de explorar temas variados – uns mais positivos, outros surpreendentes e contra-intuitivos (se considerarmos como intuição a “sabedoria” popular), outros mais trágicos. Mas tudo isso não é senão a história da humanidade.
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